Na corda bamba de um descaso público
do Incid
“Nós estamos sendo expulsos covardemente, por medo, ameaça e bala!”. O desabafo do presidente da Associação de Homens e Mulheres do Mar (AHOMAR), Alexandre Anderson de Souza, sintetiza a situação dos pescadores artesanais das Baías de Guanabara e Sepetiba, exposta em Audiência Pública na manhã desta quarta-feira (01), na Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
A entidade denunciou as sistemáticas violações ocorridas com o avanço das obras do Complexo Petroquímico do Estado do Rio de Janeiro (Comperj) e cobrou publicamente justiça pelos assassinatos de pescadores artesanais. Desde 2009, quatro lideranças da associação já foram mortas.
Sem ostentar discursos, Souza expressou sua preocupação com simplicidade de palavras e gestos. Questionou a responsabilidade socioambiental da Petrobras, e as ausências de envolvimento com a sociedade nas regiões do Complexo. “Fico muito triste porque o Ministro da Pesca não pode comparecer, e a Petrobras não mandou nenhum representante para compor a mesa”.
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Alexandre contou que Paulo Santos Souza, ex-tesoureiro da AHOMAR, foi espancado em 2009 em frente a sua família e assassinado com cinco tiros na cabeça. Em 2010, Márcio Amaro, fundador da associação, foi assassinado em casa, em frente a mãe e esposa. Em junho de 2012, Almir e Pituca, ambos da mesma entidade, desapareceram quando saíram para pescar. Os corpos foram encontrados dias depois. Nenhum dos crimes foi esclarecido. A entidade lançou, no mês de junho, um manifesto de repúdio aos assassinatos e desaparecimentos.
Iniciativa do vereador Edison da Creatinina (PV) junto a sociedade civil, AHOMAR e moradores locais, a audiência foi pautada por denúncias e cobranças. “Nós esperamos que daqui saiam os primeiros passos para os esclarecimentos do que está acontecendo”, disse Creatinina. “As ações do Comperj têm não só contaminado a Baía, como criado uma série de problemas para as famílias que vivem da pesca”, ressaltou. O Comperj é considerado um dos maiores investimentos da história da Petrobras.
Os pescadores fizeram um apelo à população, lembrando que a pesca artesanal é responsável pelo sustento de muitas famílias e por parte da produção alimentícia do Estado do Rio de Janeiro. Isac de Oliveira, da Associação de Pescadores e Aquicultores de Pedra de Guaratiba, lamentou o descaso com a atividade o que, segundo ele, acabará afetando direta ou indiretamente a vida de toda a população. “Estamos perdendo nossas águas, nosso modo de vida, a soberania alimentar deste estado está em risco!”
Desapontados com representatividades falhas e quase tão cheias de pompas quanto as paredes arquitetônicas da Câmara, homens e mulheres do mar mostraram-se indignados. Já exaustos pela longa espera por ações do poder público, não esconderam a grande insatisfação com a falta de políticas sociais.
Para o vereador Eliomar Coelho (PSOL), a importância de trocas efetivas entre Poder Público e Sociedade Civil é uma clara necessidade. Chamou a população ao diálogo com o poder Institucional, e quando este não for possível, à mobilização. ”Se esse diálogo não é funcional, vamos continuar com outro tipo de diálogo, esse no campo das resistências!”, declarou.
Os problemas na Baía de Guanabara não se restringem à questão da pesca e dos crimes ocorridos na região. Os impactos das ações do Comperj também ferem a sustentabilidade ambiental. “Ainda há vida na Baía de Guanabara”, de acordo com Breno Herrera, chefe da Área de proteção Ambiental (APA), de Guapimirim, a Baía de Guanabara ainda conta com áreas de manguezais intactos e com espécies naturais antigas, que estão sob ameaça.
A Audiência seguiu com Ato público em Repúdio à Morte dos pescadores saindo da Cinelândia, no centro do Rio, em direção aos edifícios da Petrobras e do BNDES.
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