Comunidades pesqueiras querem ter direitos reconhecidos
do Incid
O Movimento Nacional dos Pescadores e Pescadoras (MMP) vem desenvolvendo, nos últimos anos, um intenso trabalho de base com o propósito de amparar comunidades pesqueiras no enfrentamento de grandes projetos que ameaçam suas atividades. Paralelamente, o movimento reúne forças e agrega parceiros para construir instrumentos legais que garantam a permanência das comunidades em seus territórios pesqueiros. Para o MPP, o modelo de desenvolvimento econômico adotado pelo Estado vem ameaçando a existência dos territórios pesqueiros e consequentemente o patrimônio cultural de pescadores e pescadoras artesanais. Assim, uma campanha nacional pela regularização do território das comunidades tradicionais pesqueiras está em curso. O lançamento no Rio de Janeiro, no dia 19 de outubro, contou com a presença dos representantes do Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais, de autoridades locais e de alunos e professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), instituição realizadora do evento na cidade.
A intenção da campanha é construir instrumentos legais aliados à resistência e articulação das comunidades para que sejam instrumentos de luta na preservação do território e efetivação dos direitos dos pescadores e pescadoras artesanais no Brasil. Segundo o movimento, a pesca artesanal vem garantindo a segurança alimentar e nutricional de milhares de comunidades pesqueiras no Brasil, quase 70% do pescado produzido no país. Além de ser um alicerce econômico, trabalhadores e trabalhadoras da pesca artesanal desenvolveram ao longo da história uma série de saberes, fazeres e sabores que representa em síntese elementos culturais de matriz indígena e afro-brasileira, daí sua importância tradicional como transmissores de uma memória viva.
Uma cartilha foi lançada para esclarecer os pontos mais cruciais da campanha e a importância de territórios pesqueiros serem considerados territórios tradicionais. Dentre os pontos de discussão figuram a questão da identidade das comunidades pesqueiras, o território nacional, bem como os conflitos que estão ameaçando a vida e os territórios das comunidades pesqueiras. A cartilha mostra ainda a relevância dessas comunidades para o Brasil, e trata da importância desse território para toda a atividade da pesca.
Para os representantes da campanha, o território tradicional pesqueiro é entendido como um território coletivo de autonomia, liberdade e relação harmoniosa com os recursos naturais. Assim, a pesca artesanal se refere a um campo de conhecimento específico. O que o movimento afirma é que as comunidades pesqueiras, pela sua tradicionalidade, têm direito à auto-identificação e ao território físico, material, imaterial e cultural para que preservem o seu modo de saber e fazer. Ressaltam que esses direitos são sistematicamente negados e faltam instrumentos jurídicos para a delimitação, demarcação e titulação do território pesqueiro.
O MMP explica que a pesca é uma atividade milenar e que isso significa que pescadores e pescadoras estabeleceram uma relação peculiar com os recursos naturais, com efetiva importância econômica, social e cultural. Ressalta ainda que é importante reconhecer que as diversas estratégias utilizadas por essas comunidades garantiram a preservação dos seus territórios tradicionais, bem como sua reprodução física e cultural.
Planejamento estratégico na luta pelos territórios pesqueiros
São quatro ações estratégicas de todas as comunidades tradicionais pesqueiras do estado do Rio de Janeiro. Dentre os pontos a serem defendidos estão a identidade e representatividade da categoria de pescador(a) artesanal; acompanhamento, denúncia, fortalecimento da resistência aos megaempreendimentos em áreas de pesca artesanal e de comunidades tradicionais; campanha pelos territórios da pesca artesanal e o projeto de lei de iniciativa popular sobre reconhecimento, proteção e garantia do direito ao território das comunidades tradicionais pesqueiras; estratégias em defesa da criação, apoio e fortalecimento de políticas públicas para a pesca artesanal (específicas).
As estratégias de movimento em defesa dos territórios pesqueiros exige ainda que os pescadores sejam consultados na implementação de empreendimentos, não somente através de audiências públicas. Dentre as ações, algumas específicas estão voltadas para a Baía de Guanabara. As requisições quanto a essa região são: que a exploração dos pontos de pesca seja feita a partir de uma formalização, indicando aqueles que são responsáveis pela coleta de assinaturas; que conselhos sejam feitos com a comunidade pesqueira para informar e divulgar as bases de ação; que se realizem caravanas para buscar a produção da identidade; a união com outros movimentos populares também é valorizada, assim como o resgate das histórias e festas da comunidade.
Saiba como recorrer para regularização da posse coletiva das comunidades tradicionais
É possível recorrer tanto para as áreas particulares quanto para as áreas públicas. A posse coletiva das comunidades tradicionais em áreas particulares pode ser requerida pela desapropriação por interesse social, ou usucapião coletiva. Já para áreas públicas, o requerimento pode vir da concessão de direito real de uso, ou do sistema nacional de unidades de conservação (reserva extrativista e reserva de desenvolvimento sustentável).
Existem ainda leis que reconhecem e garantem os direitos das comunidades tradicionais sobre seus territórios. Os direitos estão assegurados nos seguintes diplomas legais: Constituição Federal de 88; Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Congresso nacional por decreto legislativo 143/2002; Decreto 6.040/2007 da Presidência da República e lei Federal 9.985/2000. Segundo o movimento, a Convenção 169, ao falar sobre “povos indígenas e tribais” considera que a “comunidade tradicional” possui direitos sobre seus territórios.
Comentários não são permitidos.