O Incid e o processo de fortalecimento das Redes de Cidadania Ativa Municipais
Na diversidade cultural e política de um território composto por 14 municípios do Estado do Rio de Janeiro, a luta por direitos se renova através do processo de construção de Redes de Cidadania. A ação, que vem sendo fomentada desde a primeira etapa do Projeto INCID (Indicadores de Cidadania) visa qualificar o debate sobre atuação da sociedade civil organizada e projetar o início da construção coletiva de indicadores intramunicipais.
São aproximadamente 1.400 organizações participantes, visando discutir o estado da cidadania de mais de sete mil residentes no território do Incid. A área de atuação inicial do projeto se estende pelos municípios da área de influência do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, localizado em Itaboraí. Participam da construção das Redes Intramunicipais, movimentos sociais e organizações atuantes nos municípios de Niterói, São Gonçalo, Itaboraí, Cachoeiras de Macacu, Tanguá, Rio Bonito, Saquarema, Maricá, Casimiro de Abreu, Silva Jardim, Nova Friburgo, Teresópolis, Guapimirim e Magé.
Com o objetivo de fortalecer a sociedade civil em cada município, o Incid propõe um debate sobre a atuação dos movimentos sociais, sobre o sistema de trabalho em Rede, busca construir coletivamente indicadores intramunicipais e tenta fortalecer a apropriação dos dados como plataforma para ações mais concretas e qualificadas dentro do território. Para Ramon Viera, presidente da Associação de Moradores do Bairro Porto das Caixas, e participante da Rede de Itaboraí, “os dados construídos pela rede dão argumentos e fortalecem as reivindicações pontuais, para construção de políticas públicas”. O morador do município de Itaboraí avalia que a coleta de dados realizada pelo Sistema Incid revela uma realidade mais próxima à vivência dele no município, do que os dados oficiais, e, contribui muito com as organizações e movimentos sociais.
Assim como Ramon, o colaborador da Associação de Moradores do Cantagalo, José Plácido, acredita que a possibilidade de diálogos e conexões por meio das Redes resgata a força que alguns movimentos perderam no isolamento do campo de atuação. “A produção de dados e a Rede em Niterói são importantes para rearticular o campo da saúde pública local, pois está resgatando temas e contatos de pessoas que estavam esquecidas, mas que ainda atuam no município”, disse.
As Redes
De acordo com o projeto, as Redes de Cidadania funcionam como elos (ou nós), entre as diversas instituições atuantes no território. Para que elas sejam autosuficientes, devem estar em constante movimento, estabelecendo conexões entre os participantes. Como, inicialmente, deve possui um caráter aberto, a expansão deverá ser natural, de acordo com o tipo de comunicação estabelecida. A rede precisa possuir um caráter autônomo e horizontal, com atuação específica e ações coletivas. Ela deve ser ligada através de um conjunto de valores compartilhados que, neste primeiro momento, seria a produção dos Indicadores de Cidadania Intramunicipais, os “incidinhos”, como foi carinhosamente batizado nos municípios.
Com a intenção de ganhar ressonância na consolidação das políticas públicas locais, a produção de indicadores intramunicipais é uma demanda apresentada pelas organizações que participaram da primeira etapa projeto e que mostraram a necessidade de colaboração mais precisa na luta por direitos.
Nesta etapa do Projeto Incid serão produzidas, pelos atores sociais que compõem as Redes de Cidadania Ativa em conjunto com a equipe do Incid, pesquisas específicas para cada município, a fim de mapear o estado da cidadania local. Para essa produção, foram escolhidos alguns direitos iniciais de trabalho: o Direito à Saúde, Educação, Cultura, Vida Segura da Mulher, Justiça Ambiental e Direito à Participação e Ação Cidadã. Outros direitos a serem discutidos ainda estão sendo definidos pelas redes.
Ana Maria, representante do Centro Universitário da Serra dos Órgãos (UNIFESO) na Rede de Cidadania Ativa de Teresópolis comenta a importância de organização dos movimentos sociais. “Não basta ter somente os encontros, as organizações devem se instrumentalizar e exigir do poder público os seus direitos. Acredito que os indicadores são um desses instrumentos para a mobilização local”, finaliza a professora.
Atuação em Rede
Para Manuela Amaral, supervisora de campo, uma das principais necessidades da rede está na compreensão do Sistema de Indicadores e a possibilidade de autonomia que o sistema oferece. “Uma das coisas que torna o Incid um projeto diferenciado, é o esforço de toda a equipe para que esta não seja mais uma rede sem funcionalidade para a população. A proposta do Incid é exatamente o contrário, o objetivo é a garantia de autonomia na utilização das ferramentas e da produção de indicadores, para ampliação dos direitos e melhoria da qualidade de vida”. Manuela avalia que, mesmo após a saída da equipe do projeto, a intenção é que as Redes continuem produzindo seus indicadores, os avaliando no tempo, e agregando mais entidades.
Já existem casos como este na rede de São Gonçalo. Segundo supervisor Genesis Oliveira, o grupo se apropriou tão rapidamente do Sistema de Indicadores, que já tenta construir uma produção independente sobre outros direitos, para além dos discutidos inicialmente pelo Incid. “Este é o cenário perfeito. Sempre pensamos em dialogar com as Redes desta forma, para que o processo não necessariamente ficasse circunscrito a discussão das ferramentas técnicas do Incid. A apropriação desses dados e da forma como são produzidos foi uma surpresa maravilhosa, pois acreditávamos que este seria um processo posterior à nossa produção. “, disse.
Essa dimensão da materialização das lutas sociais em dados é a raiz do Incid, que tem o compromisso ser uma ferramenta importante na vida política da cidadania ativa dos 14 municípios. Porém, antes da consolidação das Redes, a diversidade de cada local originou alguns desafios para a equipe do projeto. Para o supervisor de campo, Robson Aguiar, um dos grandes desafios foi “conseguir apresentar a importância da incorporação dos dados e informações no cotidiano das instituições, como instrumento de garantia de direitos”. Robson acredita que esse processo de diálogo revelou às entidades que, para além da militância e das ações políticas diretas, o Sistema de Indicadores consegue viabilizar um refinamento científico à estrutura da luta, “as próprias organizações entendem que seu saber tradicional, a partir das bandeiras de luta e da sua atuação, ganha volume e qualidade na medida em que incorporam elementos e dados do território que atuam” completou.
Mesmo com as diferenças geográficas entre os municípios, o processo de construção das redes surpreendeu. Apesar dos desafios, como o baixo número de instituições em alguns municípios – apensas 16 entidades ativas na Rede de Tanguá, por exemplo – o perfil de formação social e coletiva dos participantes ajudou no processo. É importante salientar que o diálogo com novos atores sociais ainda está sendo estabelecido, o que propõe novas possibilidades de atuação e enfrentamento às violações de direitos.
Fórum de Cidadania
A nova fase do Incid lança um desafio a todo o território. A partir da construção e fortalecimento das 14 Redes de Cidadania Ativa Municipais, o projeto propõe a criação de encontros regionais entre estas redes, para que o diálogo entre os municípios seja realizado de maneira à visibilizar as violações de direitos comuns aos 14 municípios. Assim como, dialogar sobre o estado dos direitos no território como um todo. O Incid mantém o objetivo de inaugurar, assim, novos instrumentos de intervenção política no país.
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